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sexta-feira, outubro 31, 2008

Festival Panorama de Dança 2008

Meu roteiro:

30/10 - Umwelt - Cie. Maguy Marin (França). Depois de cinco anos, a companhia volta ao Rio com um espetáculo inspirado em textos de Beckett. O mote é a falta de sentido para a existência humana. As ausências também são tema. Clique AQUI para ver uma palhinha.
31/10 - A Glimpse Of Hope - Deja Donne (Itália). O olhar feminino do mundo nos últimos 50 anos.
01/11 - H3 - Grupo de Rua de Niterói (Brasil). A técnia hip-hop e suas interseções com a cena contemporânea.
04/11 - Qwerty - A.P.I. (Japão). A fusão de corpos reais e projetados.
05/11 - Império, Love to Love You, Baby - Ricky Seabra (Brasil). Discussão irônica sobre as influências culturais dos EUA no mundo.
06/11 - Accords - Thomas Hauert (Bélgica). Relação entre corpo e som.
07/11 - We Failed to Hold this Reality in Mind - Impure Company (Noruega). Música, movimentos e imagens da cultura iraniana para confrontar o público.

Indico:

31/10 - Ritornelo - Renato Vieira Cia. de Dança (Brasil). Como já escrevi aqui no Mirar & Ver, este é o melhor espetáculo de dança que já assisti.
01-02-08-09/11 - Manual de Instruções - Cia. Dani Lima (Brasil). O espetáculo explora a relação entre a esfera pública e a privada. Destaque para a presença de André Masseno.

Mais informações no site do Festival:
www.panoramafestival.com

quinta-feira, outubro 23, 2008

Romance na PB

Vastos são os recursos imagéticos que o interior do Nordeste, em especial da Paraíba, empresta ao cinema feito pelo diretor Guel Arraes. Seja como cenário para roteiros versando sobre as intermitências do sertão (“Auto da compadecida”), seja pela paisagem natural. Desta vez temos a oportunidade de ver o deslumbrante “Lajedo de Pai Mateus”, formação rochosa de Cabaceiras-PB, em “Romance”, novo filme de Arraes.
O filme apresenta a história de um diretor de teatro, Pedro (Wagner Moura), que se apaixona por Ana (Letícia Sabatella), uma atriz que escolhe para viver o papel de Isolda, da lenda “Tristão e Isolda”. O conflito começa quando, pelo sucesso no teatro, Ana vira “estrela de TV”. Anos mais tarde, Pedro cria um especial-de-fim-de-ano para a TV, sobre a lenda celta, tendo a paisagem paraibana como cenário.
A sempre atual discussão sobre as diferenças entre representar na TV, no teatro e, claro, no cinema é uma das questões centrais que atravessam o filme. Ponto resumidamente bem tensionado pela personagem de Andréa Beltrão (empresária de Ana) quando pergunta: "por que representar para 300 pessoas, se você pode representar para 30 milhões?".
A outra questão que direciona o roteiro passa sobre a representação do amor na dramaturgia e na vida real. É assim que Pedro e Ana tentam encontrar uma nova forma de amar, menos trágica e mais livre. Mas sem perder a emoção. Lançando-se na dialética da paixão imortal versus representação amorosa.

“Romance” se estrutura a partir de citações, referências e colagens de outras obras. Porém, se noutros filmes do diretor era possível identificar um “fôlego barroco” a partir de imagens sobrepostas e de filmes-dentro-do-filme, agora os artifícios intertextuais partem de textos literários e suas interpretações. Arraes alicerça o discurso das personagens dialogando com “Romeu e Julieta” e “Cyrano de Bergerac”, entre outros, decisivos para a construção do imaginário do amor romântico.
O resultado impressiona, não apenas por materializar os diálogos entre tais textos, mas por fazê-lo numa linguagem acessível para qualquer público. Se nos primeiros minutos do filme tudo soa como um vídeo-clip para o tema da ópera “Tristão e Isolda”, do compositor Richard Wagner, as teses levantadas ao longo do filme rendem boas discussões sobre o amor nos dias atuais, sem se perder nas falsas e fãs representações.

Texto Publicado no Jornal A União-PB 18/10/2008

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

= Show Marina Lima & Banda – A qualidade do som dos shows de Marina continua impecável e sempre atualizada.
= Show Ana Canãs – Ela tem excelente presença de palco e certa competência vocal. Precisa apenas encontrar um estilo próprio e exagerar menos no prolongamento de algumas notas.
= Exposição Corpo Humano Real e Fascinante – Inquietante e assustadora. Museu Histórico Nacional-RJ.
= Exposição Arte e Música – Maravilha de ver como a música pode estar conectada com outras linguagens artísticas. Caixa Cultural-RJ.
= Dança Ritornelo – Dentre todos os espetáculos de dança que já vi, este é o melhor. A consciência técnica e corporal dos bailairinos impressiona. A coreografia dialoga com o que há de mais atual na filosofia e literatura.
= Lendo História Sexual da MPB – Trabalho de fôlego que Rodrigo Faour desenvolveu sobre a evolução do amor e do sexo na nossa música popular. Estou devorando o livro e suas quase 600 páginas, com sua escrita acessível.
= Espetáculo Vida e Morte de Eloá – Desculpem, mas com a espetacularização do fato, com um enterro que a mídia quase comparou ao de Ayrton Senna e com camisas sendo vendidas com o rosto da jovem a R$15... Isto é ou não é um espetáculo?

terça-feira, outubro 14, 2008

Maratona Festival do Rio 2008

Entre outros vi:

Chris & Don = Documentário sobre a vida do artista Don Bachardy e seu relacionamento com o famoso escritor Christopher Isherwood (autor dos textos que deram origem a Cabaret e Adeus Berlim, por exemplo). O filme é narrado, em sua grande parte, por Bachardy e tem cenas bem cuidadas com imagens dos dois - realizada pelos próprios Chris e Don nos anos de 1950. Destaque para as animações feitas a partir de desenhos íntimos trocados entre os dois durante a relação.

O homem que engarrafava nuvens
= O documentário-musical apresenta a vida e a obra do compositor, advogado, deputado federal e criador das leis de direito autoral, Humberto Teixeira, "o doutor do baião", como denominou Luiz Gonzaga, seu parceiro em muitas canções. O filme tem depoimentos importantes para o entendimento da evolução de nossa música. Não fosse o egotrip da filha de Teixeira, a atriz Denise Dumont, o filme seria perfeito.

Se nada mais der certo
= Cauã Reymond em eficiente atuação. Destaque para a personagem andrógina de Caroline Abras (trabalho incrível). A densidade do papel de João Miguel. E atuação sempre inquietante de Milhem Cortaz, agora como um travesti.

De repente, no inverno passado = Trata da reação da Igreja, de políticos e da sociedade italiana contra os direitos de união civil entre homossexuais italianos, a partir da visão de um casal gay que sai com uma câmera pelas ruas, entrevistando políticos e sociedade civil. As respostas são de assustar. Eles se dão conta de que vivem em uma bolha. Interessante para pensar nas nossas esferas de controle e proteção particulares.

Verônica
= Andréa Beltrão vive a professora/protagonista que dá nome ao filme. Certo dia, a professora descobre que os pais de um de seus alunos foram assassinados e o menino está sendo seguido pelo tráfico e pela polícia corrupta. Assim, ela decide proteger o garoto e salvar a própria vida, que andava sem graça. O filme tem excelentes cenas de ação e é uma oportunidade de ver a atriz num papel distante da comédia. Muito bom perceber que já somos capazes de criar um thriller policial tão bom!

Vingança = Apresenta a história de um jovem (Eron Cordeiro) do interior do Rio Grande do Sul que se vê envolvido numa trama em busca do homem que violentou sua noiva. A partir deste mote, o diretor Paulo Pons direciona o olhar do expectador para os jogos entre o sentimento de ira e a real natureza da personalidade de Miguel (Cordeiro). Só do meio para o fim do filme, quando os personagem mostram suas faces, é que a história ganha fôlego. Até então, o argurmento se arrasta por cenas dispensáveis. Mas vale a pena conferir o filme.

Paulo Gracindo, O bem amado = Paulo Gracindo (1911-1995) foi um dos atores mais populares do país. Através de depoimentos de colegas e amigos e de um rico material, o filme trata da trajetória do ator, com todas as dificuldades enfrentadas por uma vida dedicada à arte.

A guerra dos Rocha = Ary Fontoura reforça seu importante e competente trabalho como ator. O filme é mais um "cinema pipoca" do Jorge Fernando, em que três filhos vivem em pé de guerra sobre quem deve ficar com a mãe (Fontoura). Só vale mesmo pela atuação de Fontoura, no mais o roteiro é confuso e as atuações (não todas) são caricatas e estereotipadas.

Palavra (En)Cantada = De Helena Solberg o filme é fundamental para quem estuda ou pretende estudar poesia. Ele trata da aproximação entre letra e melodia, ou seja, da canção, e tenta desmistificar, a partir de argumento, tanto de teóricos, quanto de artistas a distinção entre poesia e letra de música.

Rinha = Filme com cenas reais traz à tona a polêmica sobre as lutas clandestinas em um contexto de festa regada a álcool, drogas, sexo e muitos dólares, em que ricos pagam para pobres lutarem. Filme denso, com cenas fortes e humor negro interesante. Interessante para perceber como certos conceitos hierárquicos continuam fortes na nossa sociedade.

Feliz Natal = A estréia de Selton Mello como diretor prova que ele soube tirar excelente proveito de seus trabalhos como ator. "Lavoura Arcaica", por exemplo. Com fotografia a la Antonioni, o filme "Feliz Natal" apresenta um homem que decide retornar à capital após muitos anos e encontra sua complicada família, emaranhando por recordações e problemas complexos. O filme exige atenção do público, pois tudo fica no campo da subjetividade. Nenhuma informação é dada gratuitamente.

A Erva do Rato = Baseado em dois contos de Machado de Assis - "A Causa Secreta" e "Um Esqueleto", Júlio Bressane cria um clima claustrofóbico sobre a relação de Ele (Selton Mello) e Ela (Alessandra Negrini). De textos ditados por Ele e copiados por Ela a relação passa à fotos eróticas dela que são roídas por um rato. Ele vai a loucura, enquanto Ela tem tesão. O filme causou desconforto diante de cenas em que Ele tira fotos de Ela nua em posições "ginecológicas".

Pan-Cinema Permanente = Documentário que tem como eixo temático o poeta Waly Salomão, artista que se manifestava em múltiplas direções. O filme tenta seguir, com sucesso, uma proliferação de meios para apresentar uma personalidade que sempre procurou romper a fronteira entre realidade e ficção.

terça-feira, outubro 07, 2008

Dois cantos-flash

Susan Sontag escreveu que uma “fotografia é, antes de tudo, um modo de ver. Não é a visão em si mesma”. Tal afirmação ecoa fundo em quem se propõe a observar que na vida não existe uma foto final ou total. Cada qual procura “tornar presente” os recortes íntimos que o atravessamento de tudo nos impõe. Como flashes semi-cortantes.
Estas reflexões são inevitáveis se percebermos os novos discos de Marcelo Camelo e Frejat como fotografias íntimas do universo ao redor destes dois artistas, e como a realidade suporta olhares diferentes.
Em seu primeiro trabalho solo desde que o grupo Los Hermanos entrou em recesso, Marcelo Camelo faz de “Sou” um registro da solidão. A doce solidão que estimula uma profusão de experimentos – letras e ritmos – que se misturam à própria voz do cantor. A certa altura ele diz “solidão, foge que eu te encontro”, intensificando o processo do discurso noturno de quem se questiona sobre o que fez com a liberdade moderna.
“Sou” vibra tão próximo do ouvinte que se tem a sensação de estarmos no lugar onde Camelo “melancolicamente” compõe, por exemplo, o delicado carimbó “Menina bordada”. Mesmo quando ouvimos a marchinha “Copacabana” é a solidão do trabalho e a saudade de outros carnavais o que se impõe como estrutura semântica.
Oposto a isso, em certa medida, temos “Intimidade entre estranhos”, terceiro disco solo de Frejat. Nele o tema central das letras é a dialética entre o “controle remoto” e a verdade. Ou seja, é o registro de um ser que fica dividido entre a fantasia e o “cheiro de fumaça dos carros” e entre a segurança e o desejo de ver além do perigo.
Como já vinha fazendo, Frejat parece acompanhado por uma musa que guia e inspira seu canto, ora para letras engajadas - “Eu só queria entender”, ora para a indefinição de papéis nas relações afetivas - “Farol. Mas não ultrapassa isso e mantém sua postura de “rapaz bem comportado” longe do Barão Vermelho.
Num mundo onde tudo parece já estar etiquetado, nomeado e mapeado, em que nos resta apenas reconhecer as coisas, uma foto pode estar querendo apenas dizer que “algo” também é possível. Se assim for, “Sou” e “Intimidade entre estranhos” são dois cantos-flash (não opostos, mas distintos) da certeza de que a vida se faz nas anotações do dia-a-dia de um mundo absurdo, onde a lei de causa e efeito perdeu sentido.

Texto Publicado no Jornal A União-PB 04/10/2008

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:


Comentário sobre os filmes, semana que vem!