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terça-feira, junho 24, 2008

Guernica 3D

O vídeo abaixo é um trabalho de animação espetacular
que faz uma leitura comovente do quadro em 3 dimensões.




“A existência do mundo só se justifica como fenômeno estético”
(Nietzsche, A Origem da tragédia).

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

= Filme Get Smart (Agente 86) – O filme é hilário. Tem seqüências incríveis, dignas do agente 007. Além de inúmeras referências e citações de outros filmes, como Borat, por exemplo.
= CD Sam Sparro (Sam Sparro) – O novo queridinho dos antenados apresenta um trabalho sólido e de consciência crítica sobre a música de hoje. Com samples e referências de Prince, entre outros, o cd é um achado imperdível. O vídeo de "Black and Gold" está no YouTube (http://www.youtube.com/watch?v=eHuebHTD-lY). Vale a pena conferir!
= Exposição Mar de homens (Roberto Linsker) – Excelentes fotografias sobre o dia-a-dia de pescadores de diversos lugares do Brasil. Linsker capta momentos de extremo lirismo em meio à rusticidade da vida dos homens do mar. Na Caixa Cultural - RJ, até 27/07.
= Show Ciranda do mundo (Fênix) – Este pernambuco que já rodou o mundo brinda o público com um belo espetáculo de voz e perfórmance. Pena que os registros de sua voz em cd digam muito pouco de sua presença no palco.

segunda-feira, junho 16, 2008

Falsa Verdade

Clarice Lispector dizia que “os fatos são sonoros, mas entre os fatos há um sussurro” e era o sussurro o que lhe interessava. Cazuza cantou que “há um incêndio sobre a chuva rala”. Ambos, falam da posição de quem percebe que por trás das aparências há algo para ser revelado. De certa forma, esta busca por conhecimento é o motor da própria existência humana. Desde muito cedo, percebemos que descobrir gera prazer.
Um exemplo disso está no papel
que a atriz Cate Blanchett interpreta no filmeIndiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal”, atualmente em cartaz nos cinemas. A personagem, que poderia resultar numa vilã como tantas outras, tem em sua seqüência final uma sugestão simplesmente espetacular. Irina Spalko (Blanchet) é uma oficial soviética que deseja dominar o mundo, não pelo poder das armas, mas através de uma força maior que tudo. A ânsia pelo saber total, pelo conhecimento desmesurado, pelo igualar ao divino, leva a oficial a uma experiência de transcendência, em que, inebriada e extática, descobre algo muito além do que um humano está preparado para suportar.
Uma interessante passagem da mitologia grega narra a história da jovem Sêmele que, incitada pela ciumenta Hera, pede que Zeus, de quem é uma das amantes, se mostre em todo o seu esplendor, sem ter consciência de que a um mortal é impossível tamanha revelação. O resultado tem proporções trágicas. Sêmele tem o corpo fulminado e reduzido a pó pelas luzes radiantes que emanam de Zeus.
Obviamente, as motivações das duas são bem diferentes, além do intrínseco e humano desejo de acesso ao desconhecido. Superficialmente, podemos pensar que, enquanto Irina Spalko acredita que os segredos da Caveira de Cristal possam ajudá-la a dominar o mundo, Sêmele é “apenas” um joguete nas mãos de Hera, "a mais excelsa das deusas".

O conhecimento, como acesso à verdade, é um ponto de vista.
O objeto do saber estará sempre em relação com o sujeito que o observa. A verdade, assim, torna-se humana, logo, falível, escorregadia, adaptável e, vez por outra, perigosa.
Levantar o véu do encoberto parece ser arriscado, talvez por isso “mentiras sinceras” sejam interessantes. Mas fica sempre a inquietante dúvida lançada por Riobaldo, person
agem criado por Guimarães Rosa em “Grande Sertão: Veredas”: “Como é que se pode gostar do verdadeiro no falso?”.
Vale a pena assistir ao filme e sair pensando nestas questões que o cinema, vira e mexe, consegue tratar tão bem com os recursos e efeitos especiais próprios da linguagem cinematográfica.


* Texto publicado no jornal A União/PB em 16/06/2008.

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

* CD Banda Larga Cordel (Gilberto Gil) – Força da cultura nordestina, numa “linguagem de feira”, projetada e condensada com a força quântica. Percepção otimista do não-lugar do ser humano diante das esferas espaciais do mundo de hoje. "Não grude não", por exemplo, tematiza a efemeridade das relações. "Olho mágico" é sexualidade bruta, com melodia manhosa. E “Despedida de solteira”, que recupera a malícia de “Xote das meninas”, não pára de rolar no meu celular. Todo o CD é muito gostoso de ouvir e de cantar.
* Filme
The other Boleyn girl – Primeiro: o título em português "A Outra" diz muito pouco da história; segundo: qualquer pessoa que conheça um tiquinho de história sabe que o boa pinta Eric Bana fica muito longe do perfil fanfarrão de Henrique VIII; e por aí vai...
* Livro
Passagem pra vida, de Overland Airton – Esta autoficção foi o primeiro livro que li sobre o tema da AIDS. Achei num sebo e reli agora. Apesar de sérios problemas na construção da narrativa, além de incoerências cronológicas, etc, o livro aborda a "volta por cima", ou não, na solidão de quem se descobre portador do HIV e me impactou ainda depois de tanto tempo do lançamento, 1992.

quinta-feira, junho 05, 2008

Traçando Três Travestis*

Caetano Veloso estreou dia 14 de maio, no Rio de Janeiro, no estilo “work in progress” poundiano, seu “Obra em Progresso”, que resultará em um novo cd, até o final do ano.
Entre canções conhecidas e inéditas como “Cor amarela”, “Perdeu” e “Por quem”, Caetano –impulsionado pelos recentes acontecimentos que envolveram um certo “fenômeno” – apresentou, voz e violão, o seu pouco conhecido frevo “Três travestis”. A canção composta em 1977 para Ney Matogrosso, mas só registrada em 1982 por Zezé Motta, numa afetada e divertida interpretação, com suas rimas em /is/ e /a/, saiu do esquecimento e virou febre na internet.
Na letra, Caetano cria uma cadeia metonímica de significantes para traçar a imagem de três travestis que se expõem numa praça qualquer. Ele explora as especificidades do travesti como figura da noite e como produto de exportação do Brasil. Diz o final da letra: “Três travestis / Três colibris de raça / Deixam o País / E enchem Paris de graça”.
Ao relacionar o corpo montado do travesti – figura que ameaça, mina e trinca nossa perspectiva arcaica de sociedade – à figura do colibri, Caetano dialoga com a trilogia que o escritor franco-cubano Severo Sarduy escreveu sobre o tema da transexualidade, “Cobra”, “Maitreya” e “Colibri”.
Nas três novelas, Sarduy demonstra sua noção de escritura como “travestimento”. Os planos de intertextualidade, ou seja, a interação entre diferentes linguagens textuais, são análogos aos planos de intersexualidade.
Se em “Cobra”, ele leva suas personagens ao submundo territorial e agressivo da transexualidade, mas também ao universo dos rituais budistas, com uma sobreposição de questões e imagens contemporâneas, em “Maitreya” Sarduy aprofunda as referências budistas e apresenta um “Buda do futuro”, resultado de uma complexa condensação de significantes. Já em “Colibri” o escritor mergulha numa zona decadente da Cuba pré-revolucionária, onde vive a personagem-título do livro, um dançarino de cabaré que seduz, pelo hibridismo sexual, os freqüentadores da casa.
Na criação neobarroca de Sarduy cada palavra parece ter uma imagem como suporte. Os registros do espaço erotizado que o travesti ocupa vão do escatológico ao puro lirismo. A coexistência de significantes masculinos e femininos, de uma “mulher com falo”, arranha a imagem do macho, “esse travesti al revés”, como definiu Sarduy, em seu livro de ensaios “Escrito sobre un cuerpo”.
Tanto a trilogia sarduyana, quanto o frevo de Caetano mostram como um tema cheio de arestas insuspeitadas pode servir à criação artística, sem panfletarismos ou moralismos, ambos esterilizantes.

* Texto publicado no jornal A União/PB em 31/05/2008.

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

= Filme The Chronicles of Narnia: Prince Caspian – Um espetáculo de elementos cenográficos e efeitos especiais.
= CD Francisco, Forró y Frevo (Chico César) – Com alguns elementos interessantes aqui e acolá, o novo trabalho soa como “mais do mesmo”.
= Exposição A Bahia de Jorge Amado – Fotografias de Marcel Gautherot, José Medeiros e Edu Simões, entre outros, do excelente acervo do Instituto Moreira Sales, criam o imaginário ideal para a obra do escritor de Gabriela, cravo e canela, livro que está completando 50 anos.
= Livro O sol e a morte, de Peter Sloterdijk – Em forma de diálogo, o livro serve como introdução à obra e ao pensamento do autor de Crítica da Razão Cínica e de A Mobilização Infinita. Além de revelar as motivações existenciais e metafísicas da investigação para compor a sua trilogia das Esferas.