Em tempos de virtualidade dos afetos, de pseudo trocas de intimidades, de amores líquidos, quase nada duráveis, a peça 4 faces do amor canta que só o amor é real. "O amor é meu país", dirão as personagens.
Seja qual for a forma - e toda forma vale a pena - em que o amor se manifesta, é na razão de ser das parcerias que o amor se realiza. E, acima de tudo, é na vontade de ser que o amor é. Sem fórmulas. Mas em um exercício diário doloroso e gozoso. Afinal, "amar se aprende amando". E cada relação é única, plural e incopiável, está além da massificação dos manuais.
Para além das brigas e alegrias, absorvendo os pólos positivo e negativo, se há amor, há o equilíbrio das potências, a vontade de estar, de permanecer, de durar, de recomeçar.
Em 4 faces do amor, o texto, as letras das canções de Ivan Lins e as melodias encontram uma equalização raríssima em musicais.
Se normalmente as canções entram como comentários ou um show a parte - seja para mostrar o virtuosismo do ator/cantor, seja para enfatizar a grandiloquência cênica, resultando em intervenção fake -, em 4 faces do amor, há uma organicidade realmente surpreendente: como se aquilo não pudesse ser dito de outra forma senão cantado, ou falado, daquele modo.
E aqui merecem destaques tanto o texto de Eduardo Bakr, dono de um labor apaixonado e lúcido sobre o material cancional utilizado, quanto a direção musical de Liliane Secco.
Sem esquecer a direção geral de Tadeu Aguiar, responsável pelas marcações exatas: promotoras do jogo cênico e do embaralhamento saboroso das possibilidades do amor - o mesmo em várias faces.
O texto cria vozes plurais para o amor, permitindo a identificação do espectador com alguma das vozes, ao mesmo tempo em que efetua o deslizamento de uma voz a outra aprofundando o multifacetamento, a palheta infinita de cores, do afeto.
Inícios, meios, fins e recomeços atravessam a história, as canções, transbordam nas interpretações dos atores em cena e enchem o palco de festa, tesão e desejo de enfrentar o trabalho gostoso (agridoce) que só o amor - o desejo de colar para somar - pode proporcionar.
Há uma intimidade tão intensa entre as personagens, vinda do trabalho excepcional de Gottsha, Maurício Baduh, Adriana Quadros e Cristiano Gualda, que a plateia não pode ter outra reação senão o aplauso caloroso ao fim de cada ato, de cada cena.
Por falar em intimidade, talvez seja este outro ponto forte da peça. Luz, cenário, atuações, canções, texto, música, tudo conspira para que a emoção venha da variação dos sentimentos apresentados. Sem pieguismo, longe disso, com humor e tesão, a ênfase está no todo estético-amoroso.
Ceder ou não? Libertador e senhor, o amor está acima de rótulos, regras e leis. E em cena cada personagem é amor da cabeça aos pés: sonha e arde. Amar um alguém diferente por dia pode ser tão excitante quanto amar um mesmo alguém (com passado, problemas e saberes) por vários dias.
4 faces do amor é uma ode à vida, ao teatro. Uma oportuna possibilidade de discussão dos sentimentos contemporâneos.
4 faces do amor é a grande surpresa deste final de 2011. Um espetáculo imperdível.
quarta-feira, novembro 23, 2011
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2 comentários:
Texto inteligente! Movimentaçao e atuaçao perfeita dos atores. Musicas de Ivan Lins nem se fala. Espetaçulo completo. Parabens ao autor e diretor.Recomendo a todos que gostam de uma boa Arte!
Luiz Henrique Rocha e Silva
Texto e análise excelentes! Fiquei com vontade de assitir à peça!
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