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sexta-feira, dezembro 14, 2007

Feliz Natal

Achei na internet, há alguns dias, este cartum e pensei que seria um bom mote para o texto que queria escrever para o Natal aqui no blog. Afinal, “presépio vivo tem todos os dias”. Guardei. Hoje sentei para escrever, mas as idéias não vinham e o texto não saía.
Para me inspirar procurei um CD que me remetesse ao clima harmônico dessa época, mas acabei revezando ora o novo CD de Arnaldo Antunes, onde ele recria “Qualquer coisa”, de Caetano Veloso, ora o excelente CD solo de Fernanda Takai, feito de canções do repertório de Nara Leão.
Acho oportuno dizer que estudei 11 anos em colégio de freiras, o que revela como esta data sempre teve um significado especial na minha educação. Educação cristã, de menino-bonzinho e bem-comportado. Mas a gente cresce, entra em contato com outras culturas, pensamentos, filosofias, teorias, práticas... amadurece. E, ao amadurecer, a gente vai deixando de querer ser "bonzinho", acaba não tendo mais aquela empolgação de mudar o mundo e percebe que o grande barato é apenas ser. Isso dá uma liberdade incrível.
Enfim, na minha infância, Natal, entre outras coisas, era um dia para se usar uma roupa nova, feita por uma costureira simpática do interior. Por isso resolvi também dar uma ao blog. Gosto da imagem de lâmpadas que se apagam e se acendem. Metáfora das novas idéias, do transitório e das coisas que iluminam, ou se deixam iluminar, dando espaço para a descoberta daquilo que estava no escuro, ou encoberto.Mas o texto natalino não saía e, ainda pensando no que escrever, fiquei navegando pelas notícias on line.
Parei na história de Ferruccio Silvestro (foto), garoto de 19 anos, espancado no último dia 30 de novembro após sair de uma boate. Os acusados – um deles menor – classe média, se apresentaram à polícia. O quê vai acontecer? A mídia vai explorar ao máximo, enquanto a matéria render, e pronto. É sempre assim, não? A preocupação forjada e a passionalidade. Mas, a mídia é feita de empresas que objetivam lucros, não esqueçamos.
Fui conferir os comentários dos leitores à notícia, e me assustei quando li: “Tem que apanhar mesmo, não respeitam ninguém, estava na rua vindo do trabalho um traste desse me cantou só não voltei para dar um esculacho pq tava com pressa.”
Arnaldo Antunes cantava no CD: “Socorro! Alguma alma mesmo que penada, me empreste suas penas já não sinto amor, nem dor, já não sinto nada...” e isso aumentou minha consternação diante de tamanha falta de... de... De que mesmo? A voz mono de Arnaldo responde: de “uma emoção pequena, qualquer coisa que se sinta... Tem tantos sentimentos deve ter algum que sirva”.
Para mim, cada vez que a mídia usa a expressão "opção sexual", agrava ainda mais a questão. Deveriam falar também em opção social para falar dos pobres, opção racial para falar dos negros, opção visual, para os cegos, opção motora, para os paraplégicos e por aí vai. Enquanto isso, uma deputada européia protesta contra o enforcamento de gays no Irã e é ridicularizada por alguns veículos de imprensa.
Mas tem também aqueles que agrediram uma doméstica na rua porque “pensaram” que ela era uma prostituta. Ou seja, se de fato fosse podia esfolar e matar, né? É bem aquela nossa mentalidade: “Aquilo com o qual eu não sei lidar (em mim), eu excluo, ignoro, mato”.
E teve também o caso do torcedor que foi espancado até a morte só porque era de um time adversário aos agressores. Etc, etc, etc... Isso sem falar nas “violências silenciosas” (talvez piores). Tem violência para tudo que é tipo e gosto. Gosto? Sim, ou não concordamos que quem pratica tais atos sente prazer?
Psicanalistas já afirmaram que estamos revelando uma crescente intolerância à dor e à frustração. Percebo como reflexo ou resultado disso, a busca por alternativas rápidas e descartáveis de prazer. A exaltação do EU aqui e agora, sem privações. Muitas são as causas e impensáveis são as conseqüências.
Mas nada do tal texto sair. Continuei navegando, ainda na busca de uma inspiração positiva e feliz, e cheguei ao blog do amigo Tiago+. Aí minha estupefação foi completa quando li incrédulo que ele havia sido espancado por três rapazes, alterados pela droga, que lhe pediram dinheiro, em um parque de São Paulo.
Quantos de nós ainda seremos agredidos? Ouço Fernanda Takai cantando “não sei pra onde vou, não sei se vou ou vou ficar, pensei não quero mais pensar, cansei de esperar”. Até quando ficaremos apenas lendo e assistindo a tudo como se não fosse conosco? Eu sei, esta pergunta já virou simplesmente uma questão de retórica.
Sem dúvidas essas não eram as imagens nem os temas que eu queria para o nosso Natal. Por fim, sem ter nem saber o que escrever, lembro de um verso de Caetano que resume tudo aquilo que minha esperança no Ser Humano ainda indica:

“Eu não espero pelo dia em que todos os homens concordem,
apenas sei de diversas harmonias bonitas possíveis sem juízo final”.

Aí estão duas excelentes palavras para um texto “diversidade” e “harmonia”, mas depois de tudo, mesmo acreditando no uso delas, não tenho ânimo para escrevê-lo. É isso. Feliz Natal!

PS: Este texto é dedicado a Rogério Pita, que saiu de cena este ano. Companheiro de anos do amigo Marcus Aurélio. Travessia – esta palavra é só pra dizer e diz.

sexta-feira, dezembro 07, 2007

Briga de Espadas e Muito Grito

Como comentei no rodapé anterior, aconteceu a 15ª edição do Festival de Cinema e Vídeo da Diversidade Sexual, aqui no Rio. Além do merecido destaque dado ao grupo carioca Dzi Croquettes (foto), que nos anos 70 inspirou uma geração de artistas no Brasil com sua atitude, essa edição demonstrou a maturidade de um evento que se consolidou como um dos mais importantes do gênero.
A referência oriental foi o mote do Festival. Desde o discutível slogan “brigas de espada como você nunca viu”, passando pelo delicado filme de abertura, Spider Lilies, até o catálogo em formato de mangá. Aliás, começar o Festival com um filme de temática lésbica foi muito interessante, porque as meninas sempre fizeram queixas sobre o exíguo espaço que elas têm em eventos como esse.
A diversidade de filmes e de t
emáticas, sempre sobre o viés da sexualidade, é o que mais chama atenção para o Festival do Mix Brasil, cuja competente direção geral é de Suzy Capó. A mostra “Desbunde Total”, por exemplo, trouxe os excelentes documentários The Cockettes (grupo que inspirou o nosso Dzi Croquettes) e Os Doces Bárbaros. a “Retrô-Erótiko” reuniu os filmes americanos Nigths in Black Leather, do ícone Peter Berlin (foto), Pink Narcissus e All Male Mash Up, sempre tematizando o ambiente criativo da época do desbunde.
Quanto ao ineditismo dos filmes... Alguns deles já tinham estado na programação do Festival de Cinema do Rio e, além disso, em tempos de
banda larga, fica difícil ser inédito. Mas o esforço do Festival é exemplar. Até porque o evento vai além da mera exibição de filmes. Serve para manter em discussão esse tipo de estética.
Já entre os curtas chamou atenção a qualidade das produções. Destaco , do brasileiro Felipe Sholl, Gay Zombie, Possessão, Cowboy Forever, o trash Kali ma e VGL-Hung, entre outros.
Todas as noites entre 21h e 0h o foyer do Cine Palácio (palco dos longas, enquanto que a CAIXA Cultural abrigava os curtas) recebia um Dj diferente para fazer o povo ferver. Aliás, no dia 05 foi a festa de lançamento da 2ª edição da Revista Junior. Ainda não li toda, mas está visivelmente superior a anterior. Sinal de que experiência gera maturidade que gera
qualidade.
Mas a festa maior é sempre o esperado Show do Gongo, comandado por Marisa Orth. A fila da entrada virou pela rua ao lado. “Foi o melhor Show do Gongo da história dos shows do Gongo no Rio de Janeiro”, comentava-se. E foi sensacional mesmo. A platéia estava impossível, houve quase uma unanimidade nos aplausos, gritos, vaias e gongadas, e Marisa estava simplesmente perfeita, com sua franqueza e afetação própria para o momento.
Tirando o júri, formado por Ciro Barcellos (dos Dzi Croquettes), o ator Thiago Mendonça e as atrizes Mel Lisboa e Zezeh Barbosa, que não teve nada de interessante para acrescentar.
O curta premiado foi merecidamente A Drag a Gozar, de Kiko César, com a participação da impagável Thália Bombinha no papel da drag. Uma homenagem à obra do cineasta Humberto Mauro, A Velha A Fiar, de 1964.
Aliás, não estaria na hora de dividir o Show do Gongo por categorias? Não dá pra julgar comparativamente um vídeo amador (a maioria) com uma produção de alto nível técnico (e artístico, porque não?) como A drag a gozar. Fica a observação, mas foi uma noite memorável.
No balanço final, ficam os parabéns aos 15 anos deste Festival que com esforço e competência leva a questão da diversidade sexual para vários lugares.

TEATRO EM DIA II

Assistimos à brilhante performance de Edwin Luisi - “Eu sou minha própria mulher”, na apaixonante história de Charlotte Mahlsdorf, uma mulher no corpo de um homem, Lothar Berfeld. História real de um travesti que enfrentou as atrocidades de Hitler de roupão vermelho e colar de pérolas. Texto e interpretação impecáveis. Vale a pena curtir este delicado e elegante espetáculo.
Depois foi a vez do grandioso “
7 - o musical”. Muito bom e merece as críticas que tem recebido, porém achamos um tanto cansativo a duração de algumas cenas, além de alguns anacronismos. Situações que poderiam ser resolvidas de maneira mais rápida se estendem, talvez para justificar o gênero musical. Mas é um belo espetáculo, desde os figurinos até as performances dos atores.
E fomos arrebatados pelo sensacional “
Cada Um Com Seus Pobrema”, de Marcelo Médici. Ele vive um ator em seu camarim e leva ao palco alguns personagens. Destacamos o Último Mico-leão-dourado do Mundo (gay), Mãe Jatira (vidente que incorpora o espírito da Branca de Neve) e Smurfete (drogada e prostituída). Longe dos estereótipos, ele constrói com versatilidade e inteligência cada uma das personagens, que parecem surgir do contato direto com o mundo. Incrível!!!