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segunda-feira, maio 18, 2009

Da tese ao livro

A maioria dos trabalhos acadêmicos fica restrita a um pequeno número de leitores, seja porque os assuntos são tratados de forma hermética demais e não encontra mercado, seja pela falta de divulgação destes trabalhos. Felizmente alguns conseguem sair dos muros acadêmicos. É o caso da tese de doutorado defendida por Lúcia Facco, sob o título "Era uma vez um casal diferente: a temática homossexual na educação literária infanto-juvenil" que acaba de ser lançada em livro.
Para quem ainda não conhece, Lúcia Facco é autora de "As Heroínas Saem do Armário" – sua dissertação de mestrado. O livro analisa cinco "romances lésbicos", e aponta que, diferente de ser uma subliteratura, tais textos são "paraliteratura", devido à marginalização imposta a eles. Outro livro publicado pela autora é "Lado B: História de Mulheres". Coletânea de contos com histórias inteligentes e sutis de mulheres que vivem seus amores por outras mulheres sem levantar bandeira e sem culpa.
Voltando ao lançamento de agora, em "Era uma vez um casal diferente" Facco discute, entre outras coisas, os (des)compromissos dos currículos escolares, que tendem a padronizar os alunos. A autora investiga tanto os cânones literários, quanto os livros paradidáticos utilizados especificamente nas aulas de literatura. Ela traça já nos primeiros capítulos o percurso das práticas de controle do sexo e sua repercussão.
Discutir um tema ainda polêmico e direcioná-lo a um público "em formação", quando, na maioria das vezes, são os educadores que precisam de educação, não deve ter sido tarefa fácil. Um projeto de peso e fôlego realizado por alguém que trabalha no ramo. A forma romântica com que Lúcia Facco direciona seu trabalho e a apresentação de uma ética quase perdida em nossos dias conseguem quebrar barreiras prováveis sobre o tema. "Dar às pessoas a oportunidade de conhecer mais a necessidade de mudar as relações de poder e dominação" é o objeto esperado e provavelmente alcançado.
Se em "As Heroínas Saem do Armário" Lúcia Facco criou uma personagem, na tese, agora livro, ela usa a primeira pessoa correndo todos os riscos. Talvez porque, como ela mesma expressou, "não dava para se colocar de fora daquilo que estava defendendo". Assisti à defesa da tese de Facco e aguardei que o trabalho merecidamente fosse lançado em livro. Não perdi por esperar. Excelente leitura para educadores - professores e pais.

Texto publicado no Jornal A União em 16/05/2009

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

= Filme Se, jie (Desejo e perigo - Ang Lee) - A fotografia e o roteiro (mesmo longo demais) confirmam como Ang Lee é um grande diretor.
= Filme He's just not that into you (Ele não está tão a fim de você - Ken Kwapis) - Mais um filme de autoajuda e engraçadinho cheio de atores conhecidos.
= Exposição Ser Jovem na França - As sequências de Elina Brotherus (O espelho) e de Laurent Van Der Stockt (Os jovens) são o melhor desta exposição que esteve em cartaz na Caixa Cultural.
= Dança Mediatriz (Núcleo de Criação do Dirceu) - Proposta interessante, apesar de ter atos que parecem ainda em construção e precisam ser melhorados no resultado.
= Instalação Mono (Núcleo de Criação do Dirceu) - O público passeava entre espaços distintos que abrigavam três bailarinos nus. A intenção de estranhamento é alcançada tanto pelos objetos utilizados, quanto pelas atuações.

sexta-feira, maio 08, 2009

IV Colóquio Filosofia e Ficção


Informações e Programação:
http://br.geocities.com/coloquiofifi/index.html

terça-feira, maio 05, 2009

O ruído perfeito

"Zii e Zie", mais recente disco de Caetano Veloso, retoma a ideia de que "a tristeza é senhora, desde que o samba é samba". Os transambas/transrocks de "Zii e Zie" dão voz a um sujeito arranhado diante da precariedade da vida. A começar pela foto da capa. Uma imagem "turvada" da praia do Leblon. De um mar que é bonito "quando quebra na praia", mesmo clicado em um dia de chuva e feito de base para um cenário desbotado. Aliás, a ausência de sol atravessa as 13 faixas. Ruínas em proliferação, até quando reconstrói Clementina de Jesus.
O aparente contraste entre o vigor da guitarra de Pedro Sá e as letras carregadas de melancolia fica apenas na superfície, já que as inspirações vêm de bandas que inventaram novos modos de fazer rock, amargo e desalentado. "Base de Guantânamo" e sua ligação temática com "Haiti" mostra isso. Já o transrock "Perdeu", que abre "Zii e Zie", mostra alguém que "cresceu nas bordas da favela" e que está revoltado com as condições sociais impostas. Antes assim (traficante) do que viver pequeno e bom. Retorno de "O herói" (o homem cordial) que fecha o anterior disco de estúdio "Cê". Mais questões sobre os sujeitos sociais do Brasil.
Outro Caetano, cronista, passeia pelo Rio. "Lapa" reflete bem isso ao listar lugares e pessoas que fazem do bairro da Lapa um ponto singular de convergência de variadas tribos. O acompanhamento melódico reflete a intenção da letra. "Pelourinho vezes Rio é Lapa" é um dos melhores versos do disco, com sua condensação simbólica e imagética absurda e linda.
É possível mesmo afirmar que "Zii e Zie" é Caetano a procura do ruído perfeito. Mesmo quando regrava "Ingenuidade" com arranjo "mais limpo" e violão bossa nova há cortes de guitarra. A sensação é a de que há vários transrocks sendo executados ao mesmo tempo. Em vários momentos do disco há repetições de frases ou de sons há exaustão. Angústia em demasia. Como "o sol já tem muito o que fazer", como o sujeito diz a certa altura, o mofo se alastra e o sujeito, por não "acreditar em Deus", não tem, nem mesmo, o consolo espiritual. Mas a autoironia aparece aqui e ali, como flashes de luz possível. Sujeito "tarado ni tudo".
Se em algumas composições de Caetano a quantidade de palavras e versos parecia ultrapassar os limites melódicos, agora são os ruídos que extravasam. "Zii e Zie" não é um disco fácil. Diversos sons, como que sampleados, "dizem" coisas que as letras silenciam. A sonoridade dos transambas é complexa demais para cantar junto e Caetano continua "comendo" prefixos e sufixos de palavras, indo mais fundo e aproximando o seu "cantar vagabundo daqueles que velam pela alegria do mundo", num resultado estético sem sonho nem segredo.

Texto publicado no Jornal A União em 02/05/2009

Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:

= Filme Monstros vs Alienígenas - Legal!
= Livro Leituras sobre música popular (Diversos) - Excelentes ensaios sobre a canção para leigos e iniciados na discussão do tema.
= Livro Leite Derramado (Chico Buarque) - Tô curtindo a narrativa bem feita do livro. Há muitos elementos meta críticos interessantes.
= CD Sem poupar coração (Nana Caymmi) - Lindo de doer!