"Zii e Zie", mais recente disco de Caetano Veloso, retoma a ideia de que "a tristeza é senhora, desde que o samba é samba". Os transambas/transrocks de "Zii e Zie" dão voz a um sujeito arranhado diante da precariedade da vida. A começar pela foto da capa. Uma imagem "turvada" da praia do Leblon. De um mar que é bonito "quando quebra na praia", mesmo clicado em um dia de chuva e feito de base para um cenário desbotado. Aliás, a ausência de sol atravessa as 13 faixas. Ruínas em proliferação, até quando reconstrói Clementina de Jesus.
O aparente contraste entre o vigor da guitarra de Pedro Sá e as letras carregadas de melancolia fica apenas na superfície, já que as inspirações vêm de bandas que inventaram novos modos de fazer rock, amargo e desalentado. "Base de Guantânamo" e sua ligação temática com "Haiti" mostra isso. Já o transrock "Perdeu", que abre "Zii e Zie", mostra alguém que "cresceu nas bordas da favela" e que está revoltado com as condições sociais impostas. Antes assim (traficante) do que viver pequeno e bom. Retorno de "O herói" (o homem cordial) que fecha o anterior disco de estúdio "Cê". Mais questões sobre os sujeitos sociais do Brasil.
Outro Caetano, cronista, passeia pelo Rio. "Lapa" reflete bem isso ao listar lugares e pessoas que fazem do bairro da Lapa um ponto singular de convergência de variadas tribos. O acompanhamento melódico reflete a intenção da letra. "Pelourinho vezes Rio é Lapa" é um dos melhores versos do disco, com sua condensação simbólica e imagética absurda e linda.
É possível mesmo afirmar que "Zii e Zie" é Caetano a procura do ruído perfeito. Mesmo quando regrava "Ingenuidade" com arranjo "mais limpo" e violão bossa nova há cortes de guitarra. A sensação é a de que há vários transrocks sendo executados ao mesmo tempo. Em vários momentos do disco há repetições de frases ou de sons há exaustão. Angústia em demasia. Como "o sol já tem muito o que fazer", como o sujeito diz a certa altura, o mofo se alastra e o sujeito, por não "acreditar em Deus", não tem, nem mesmo, o consolo espiritual. Mas a autoironia aparece aqui e ali, como flashes de luz possível. Sujeito "tarado ni tudo".
Se em algumas composições de Caetano a quantidade de palavras e versos parecia ultrapassar os limites melódicos, agora são os ruídos que extravasam. "Zii e Zie" não é um disco fácil. Diversos sons, como que sampleados, "dizem" coisas que as letras silenciam. A sonoridade dos transambas é complexa demais para cantar junto e Caetano continua "comendo" prefixos e sufixos de palavras, indo mais fundo e aproximando o seu "cantar vagabundo daqueles que velam pela alegria do mundo", num resultado estético sem sonho nem segredo.
Texto publicado no Jornal A União em 02/05/2009
Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:
= Filme Monstros vs Alienígenas - Legal!
= Livro Leituras sobre música popular (Diversos) - Excelentes ensaios sobre a canção para leigos e iniciados na discussão do tema.
= Livro Leite Derramado (Chico Buarque) - Tô curtindo a narrativa bem feita do livro. Há muitos elementos meta críticos interessantes.
= CD Sem poupar coração (Nana Caymmi) - Lindo de doer!
Outro Caetano, cronista, passeia pelo Rio. "Lapa" reflete bem isso ao listar lugares e pessoas que fazem do bairro da Lapa um ponto singular de convergência de variadas tribos. O acompanhamento melódico reflete a intenção da letra. "Pelourinho vezes Rio é Lapa" é um dos melhores versos do disco, com sua condensação simbólica e imagética absurda e linda.
É possível mesmo afirmar que "Zii e Zie" é Caetano a procura do ruído perfeito. Mesmo quando regrava "Ingenuidade" com arranjo "mais limpo" e violão bossa nova há cortes de guitarra. A sensação é a de que há vários transrocks sendo executados ao mesmo tempo. Em vários momentos do disco há repetições de frases ou de sons há exaustão. Angústia em demasia. Como "o sol já tem muito o que fazer", como o sujeito diz a certa altura, o mofo se alastra e o sujeito, por não "acreditar em Deus", não tem, nem mesmo, o consolo espiritual. Mas a autoironia aparece aqui e ali, como flashes de luz possível. Sujeito "tarado ni tudo".
Se em algumas composições de Caetano a quantidade de palavras e versos parecia ultrapassar os limites melódicos, agora são os ruídos que extravasam. "Zii e Zie" não é um disco fácil. Diversos sons, como que sampleados, "dizem" coisas que as letras silenciam. A sonoridade dos transambas é complexa demais para cantar junto e Caetano continua "comendo" prefixos e sufixos de palavras, indo mais fundo e aproximando o seu "cantar vagabundo daqueles que velam pela alegria do mundo", num resultado estético sem sonho nem segredo.
Texto publicado no Jornal A União em 02/05/2009
Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:
= Filme Monstros vs Alienígenas - Legal!
= Livro Leituras sobre música popular (Diversos) - Excelentes ensaios sobre a canção para leigos e iniciados na discussão do tema.
= Livro Leite Derramado (Chico Buarque) - Tô curtindo a narrativa bem feita do livro. Há muitos elementos meta críticos interessantes.
= CD Sem poupar coração (Nana Caymmi) - Lindo de doer!
7 comentários:
Olá Leo
Caetano continua com a mesma formação de músicos do trabalho anterior? fiquei curioso em saber se a proposta desse novo trabalho é um desenvolvimento do Ce (em termos de sonoridade).
vou procurar comprar o cd assim que sair nas lojas daqui!!
Fã incondicional do Caetano, voce, heim? Tambem, perfeito do jeito que ele é, impossivel nao gostar dele. Caetano é nosso pra sempre! bjs...
Muito, muito bom mesmo o texto, beleza pura...
Digno de revista semanal da editora Abril.
parabéns!
adorei o texto.
:)
Ótimo mesmo! Muito bom!
o texto tá supimpa mano!
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