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terça-feira, junho 05, 2007

Encontro com Caetano Veloso

Quem me conhece sabe que Caetano Veloso, além de ser (suas canções) corpus para minha pesquisa acadêmica, é para mim uma das figuras mais instigantes de nossa arte e que não consigo ficar indiferente quando o assunto é sua obra. Por isso não poderia deixar de registrar aqui no blog o meu encontro com ele, explico:
Dia 22 de maio ele participou do “Encontros O Globo – Especial Música”, no auditório do jornal O Globo, onde respondeu perguntas dos jornalistas Antonio Miguel e Cora Rónai, do ''Globo'', do cenógrafo Hélio Eichbauer e da platéia.
Eichbauer fez longas perguntas, repletas de citações, desde Pound a Sousândrade, que Caetano elogiou como “ensaios condensados”. Uma delas falava da “dádiva da maturidade” e terminava com a interrogação: “Como acontece a música?”.
— Há muitas dádivas... A paternidade em primeiro lugar... A experiência com os muitos lugares, tempos e pessoas... Sou grato pela minha vida. Mas por outro lado há a experiência da decadência, a outra face dessa moeda... Quando passei a usar óculos, aos 45 anos, foi uma tragédia para mim. Depois me acostumei. Levou dez anos, mas me acostumei. Com tudo isso, a música sai às vezes melhor, às vezes maculada por coisas como a perda da visão.

Mas, como sempre, Caetano foi chamado para dar opinião sobre TUDO, desde a atitude de Roberto Carlos ao proibir a biografia – É impossível eu me sentir bem com uma proibição, me incomoda saber que estão recolhendo livros, disse Caetano; até sobre a política do Presidente Lula: É um luxo no Brasil, por ser um dos quatro presidentes eleitos pelo voto direto que exerceram seus mandatos até o final, ele, Gaspar Dutra, Juscelino Kubitschek e Fernando Henrique Cardoso... Mas ele não é muito mais do que isso... Ele se mostrou hábil na capacidade de se manter no poder, disse.

Sobre a “Tropicália no poder”, por causa da presença de Gilberto Gil como Ministro da Cultura, comentou: — A chegada de Gil ao ministério (da Cultura) não está entre as conquistas mais relevantes do tropicalismo — respondeu Caetano. — Eu não queria que ele fosse ministro. Não me anima estar próximo do poder oficial. Disse a Gil que ele se tornaria o Lula do Lula, um símbolo de um símbolo... Daria um colorido a mais para o que Lula representa... Bastaria Gil estar ali, mas ele fez coisas, como os Pontos de Cultura e também o reconhecimento da reprodutibilidade da obra cultural nos novos tempos. Nesse pequeno aspecto, é levemente tropicalista.

Quanto às influências literárias citou Augusto dos Anjos, Bandeira, Drummond, Cecília Meireles e João Cabral e Sousândrade. Afirmando que não se considera poeta no sentido específico do termo.
Ele se empolgou mais ao falar do processo de produção de seu mais recente CD: , mostrando que as concepções dos arranjos nasceram no violão, apesar de desde o início ser pensado para ser tocado por uma banda, e aproveitou para anunciar sua intenção em gravar outro álbum com Pedro Sá (guitarra), Ricardo Dias Gomes (baixo) e Marcelo Callado (bateria):
— Gosto muito de como Pedrinho faz levadas de samba na guitarra. Quero juntá-lo com Davi Moraes, que também tem coisas boas nessa linha.

Sobre gravadoras, piratarias e download:
— As gravadoras estão acabando da forma como as conhecemos. A mudança tem aspectos excitantes, outros preocupantes, mas na essência não muda nada para os criadores, que continuam fazendo música. O compartilhamento de músicas é muito bom... Mas meu filho baixa basicamente música popular em inglês, o que já predominava na indústria.

E lançou seu olhar sobre a ordem mundial quando Eichbauer descreveu um cenário de inferno capitalista traçado por Ezra Pound:
— Apesar das previsões sombrias do meio ambiente e da disparidade de poder entre grupos de nações, acredito no futuro... O excesso da perspectiva científica desfaz a humana, que é espiritual. Pode ser que um asteróide destrua tudo, ou que as máfias dominem o mundo... Mas prefiro pensar que o Brasil tem a possibilidade de criar uma nova experiência de vida humana e fará isso.

Valeu muito a pena ficar pouco mais de uma hora na fila, só para vê-lo de perto e, além de perceber a lucidez de suas afirmações, ouvi-lo tocar e cantar: Odeio, Outro, Ta combinado, Força estranha, Minha voz minha vida, entre outras belas mostras da capacidade criativa e inventiva deste velho baiano, um fulano, um caetano, um mano qualquer.
Pena não aproveitarem melhor sua presença, através de perguntas mais pertinentes à sua produção artística.

4 comentários:

Bruno Lima disse...

Leo, Caetano não é mais "apenas" um artista, é sobretudo um intelectual, e como tal opina sobre as diversas manifestações sócio-culturais dentro e fora do Brasil. Se por um lado é ruim que o foco das perguntas não se restrinja a sua obra, por outro é bom sabermos que podemos contar com sua fala para além de seu trabalho, pois como você disse percebe-se a lucidez de suas afirmações.

Grande abraço!

Leonardo Davino disse...

Concordo, Bruno, mas, como sou pesquisador da obra dele, você deve entender minha vontade de ouvi-lo falar mais sobre isso... rsrsrs... eu ficava esperando e nada, cara.
Mas, é como você diz mesmo.
Abraço!

Anônimo disse...

Imagino o q tu tenha sentido perto dele, pois senti isso e muito mais frente a irmã dele, q para mim não canta apenas, mas se torna co-autora de tudo q fala e canta... cada gesto seu se harmoniza ao som q sai de sua boca sem esforço algum... n perdi nenhum detalhe, nenhum mesmo, fotografei dos seus pés ao seu jogado de fio de microfone, e confesso q valeu ter ficado na primeira fila... depois veja as fotos dela q eu fiz no meu album, acho q vc vai gostar.

Márcia Leite. disse...

Caetano é tudo! E mais um tanto! Bjão, Léo!

=*
=)