Upstream color é um filme de sensações. Há tempos eu não assistia a um filme tão empenhado em usar os sentidos. É no jogo dos sentidos que a "narrativa" se constrói. Utilizando o instigante livro/projeto Walden, de Henry Thoreau, e suas reflexões sobre a condição humana, como núcleo duro da trama, o diretor Shane Carruth rediscute perspectivas tais como o uso do corpo como casa e a casa como aquecedora dos afetos; os empreendimentos para fazer do sujeito o centro da discussão; o questionamento sobre o que é riqueza; a propriedade e o excesso de bens, de trabalho, de luxo; a natureza derivada da cultura versus a natureza dada do selvagem... As experiências de Thoreau sobre a tese de que a civilização moderna aperfeiçoa as casas, mas não o "a si mesmo" do sujeito" são trabalhadas dentro de uma ecologia fílmica do estado selvagem: contemplação, limitação das necessidades, obrigações e dívidas. Ao invés do som ao redor, o som de dentro.
Porém, o mais impactante é a completa ausência de ilustração facilitadora, até porque, seguindo sua inspiração filosófica, a vida é algo experimental, sem sentido definitivo. O espectador entra e sai do filme cheio de dúvidas. Até mesmo o diretor, posto que sugere a "morte" do pensamento que lhe inspirou. Por exemplo, se Thoreau sugere uma "pobreza voluntária" do filósofo, em Upstream Color a pobreza vem de forma involuntária. No filme, participar da experiência não é uma escolha posta às personagens, mas a imposição de um ciclo.
Como sabemos, para Thoreau, o que diferencia o filósofo do selvagem é que enquanto este tem uma vida simples e não complexa, aquele tem uma vida simples mais muito complexa, ou complexificada. A partir disso, ao final, algumas perguntas: se a habitação deve espelhar quem a construiu, numa era do crescimento das intervenções cirúrgicas, como estamos nos refletindo por aí? E até que ponto, pelo medo da liberdade, estamos sempre envolvidos em falsas relações?
domingo, agosto 25, 2013
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