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segunda-feira, junho 06, 2011

Macho toys

A série Macho Toys, de Fábio Carvalho, em exposição na Galeria Anna Maria Niemeyer até 18 de junho, investe no território militar para promover um deslocamento sutil nos núcleos daquilo que somos levados a entender como sendo as formas ideais do masculino.
Em Macho toys - n° 24, por exemplo, utilizando brinquedos do universo dos meninos (soldados, helicópteros e carros de guerra) em contato com o colorido das flores de plástico, Fábio Carvalho não feminiliza a imagem dos soldados de brinquedo, como pode pensar um visitante de primeira mirada.
Ao contrário, o artista restitui ao macho, ao colocá-lo, em suas virilidade e agressividade potentes, sobre pires de porcelanas, um poder que ele (o homem) outrora ostentava. Sim, houve um tempo em que colecionar porcelana era "coisa de homem" - emblema de poder: quanto mais florida a louça, mais rico era o dono - e isso não tinha, em princípio, relação com a orientação sexual.
O estranhamento em Macho toys vem, portanto, da intervenção semântica que Fábio Carvalho imprime nos conceitos culturalmente definidores de preconceitos e dores. A criação de um dispositivo de terceira margem - de frágil-vigor: a porcelana como suporte da agressividade - quer mais estimular a reflexão sobre os acordos íntimos e sociais daquilo que "serve para o homem" do que travestir o masculino em feminino.
Outro exemplo: em Dos que partem, aos que ficam (Santuário de ninfas II), Fábio Carvalho reproduz retratos de soldados da Primeira Guerra Mundial - imagens que os próprios soldados faziam uns dos outros antes da partida. Há aqui uma flagrante virilidade (composta pelo vestuário, pela pose do fotografado e pelo imaginário de quem olha) e, ao mesmo tempo, uma ingenuidade diante do terror iminente, que, emolduradas pelos decalques florais e transfer ouro do artista, complexifica as posturas, as definições nítidas do macho que pousa para outro macho que, por sua vez, capta a beleza do companheiro. Fábio Carvalho percebe, e trabalha sobre, essa dobradiça do desejo - o que pode e o que não pode ser -, desautomatizando o olhar do visitante.
Macho toys pode até ser lida como arte gay, mas isto seria uma redução tacanha das questões que a série apresenta. No fundo, amamos a mentira da maquiagem (das representações que construímos para nossa segurança). Quando floral e/ou florido, o homem se desassemelha do homem? Eis a pergunta que serpenteia a mente do visitante da exposição Macho toys.

Um comentário:

Fábio Carvalho disse...

Leonardo!
Que texto sensível, inteligente, e bonito! Obrigado!! Fiquei emocionado.
Se você me autoriza, vai integrar a lista de textos críticos sobre o meu trabalho.
Foi um dos melhores já escritos sobre os Macho Toys.
abraços!
Fábio