Ao despojarem a peça shakespeariana de toda pompa circunstancial, Gustavo Gasparani e Sergio Módena criam um Ricardo III singular e não menos potente. O investimento na lucidez vocal de Gasparani faz a peça exigir imaginação e pensamento do público. E só por isso já mereceria atenção, pois nos leva a "ver aquilo que não vemos": eis o golpe da arte.
Porém, aliados a isso, é preciso destacar os jogos cênicos desenvolvidos por um Gasparani ora comentador, e, por isso, próximo ao espectador, porque "humano", ora ator desdobrado num elenco de personagens grandiosas e diversas.
Ao final, o Ricardo que na parte III de "Henrique VI", também de Shakespeare, diz "posso sorrir e assassinar enquanto sorrir; posso gritar 'Contente!' aos que atormentam meu coração; posso molhar meu rosto com lágrimas hipócritas e compor minha face para todas as ocasiões! Afogarei mais marinheiros do que a sereia; matarei mais admiradores do que o basilisco, representarei o papel de orador tão bem quanto Nestor, enganarei mais astutamente do que Ulisses e tomarei outra Tróia como um Sínon. Sou capaz de acrescentar cores ao camaleão, de lutar em metamorfoses como Proteu, de enviar à escola o sanguinário Maquiavel" apresenta-se por inteiro diante de nós.
segunda-feira, janeiro 20, 2014
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