Achei essa foto do bonde 10 entre meus arquivos e o tempo ficou suspenso ao meu redor. Senti-me íntimo das vítimas. De uma intimidade diversa daquela meliculosamente forjada pela imprensa, com seu apelo interessado.
Venho da Paraíba e sempre que recebo visitas aqui no Rio levo meus amigos ao passeio nos bondes de Santa Teresa.
Para mim, entre tantas, uma das melhores atrações da cidade.
Olhando esta foto percebi que eu poderia ser uma das vítimas. Ou pior, ter alguém das minhas relações afetivas entre os escombros do bonde 10.
Coloquei-me no lugar das vítimas e dos sobreviventes que precisam reaprender a viver sem a presença física de seus afetos e gelei.
Pensar e colocar-se no lugar do outro dói, talvez por isso exercitamos tão pouco - e cada vez menos - este gesto.
Somos o que somos: um país complexo e complexicado. Preocupa-mo-nos mais em adquirir tablets do que em aprender a ler; regozijamo-nos mais com estruturas olímpicas do que em eliminar as salmouras imundas que minam expostas na rua Uruguaiana.
Delegamos todas as decisões fundamentais de nossas vidas aos políticos institucionalizados. E eles fazem a festa, como sabemos. E assim seguimos, sem culpa alguma para nublar nossos dias solares.
Nosso compromisso com o patrimônio material e imaterial beira a nulidade. Basta andar pelas ruas do Centro do Rio no fim de tarde para sentir um misto de nojo e vergonha tamanhos são a sujeira e o descaso.
Já disse, venho da Paraíba que, como o Rio de Janeiro, é um dos estados mais antigos do Brasil - as construções barrocas (de um barroco raro no mundo: tropical) estão lá como prova - e anoto que o abandono é generalizado.
Olhando o bonde 10 - amarelo, canarinho - miro a camisa 10. Somos o que somos - nem degradação, nem utopia - e é como diz a canção: "Quem quer trocar a copa do mundo por um Brasil sem vagabundos?"
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