A palavra crônica vem do termo grego Kronos (tempo). Este gênero tem grande presença no Brasil. A crônica é a história escrita conforme a ordem do tempo, ou seja, de modo que os fatos narrados se refiram diretamente a ele. Na crônica, o tempo é o centro da narração dos fatos, mas estes não são narrados tal como aconteceram, mas tal como os recorda o cronista, que deve ser um hábil "artesão da experiência".
Mesmo com a proliferação de cronistas - na urgência de blogs, twitters, etc-, a crônica é tida como um gênero menor em relação aos outros. Em "Escrever para jornal e escrever livro", Clarice Lispector afirma que "num jornal nunca se pode esquecer o leitor, ao passo que no livro fala-se com maior liberdade, sem compromisso imediato com ninguém. Ou mesmo sem compromisso nenhum (...) não há dúvida de que eu valorizo muito mais o que escrevo em livros do que o que eu escrevo para jornais".
A atividade do cronista é narrar os fatos segundo um ponto de vista, sem se deter em nenhum, dando a eles certa "leveza" ao discutir núcleos problemáticos de uma sociedade. A "efemeridade" do suporte, seja o jornal impresso ou os espaços virtuais, faz com que a crítica também não atribua ao gênero a devida atenção.
Machado de Assis ironizou esta condição dizendo que "o folhetinista, na sociedade ocupa o lugar do colibri na esfera vegetal: solta, esvoaça; brinca; tremula; paira; espaneja-se sobre todos os caules suculentos, sobre todas as seivas vigorosas. Todo o mundo lhe pertence; até mesmo a política". Desprovida do rigor jornalístico das reportagens e do rigor literário dos romances, a crônica é, nas palavras de Machado, "uma fusão admirável entre o útil e o fútil".
Analisando a atuação dos dois escritores citados, enquanto Machado é um intérprete de um amanhã cada vez mais veloz e de uma cidade que começa a se partir, Clarice já está vivendo esta velocidade das informações e da fragmentação do Ser, numa sociedade que se torna cada vez mais "escrava" da imagem.
Evidente que para cada autor há uma modalidade de texto, o que dificulta precisar um gênero que acabou abarcando artigos, comentários, poemas em prosa, contos e relatos de viagem, entre outras coisas. Mas multiplicam-se os autores de crônicas e é preciso estar atentos para perceber quem faz da observação do ordinário o vislumbre de milagres. Ou seja, distinguir o deslocamento do real na ficção e vice-versa.
Texto publicado no Jornal A União em 10/07/2009
Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:
= Filme A era do gelo 3 - O gelo fica na superfície, literalmente, e os personagens estão incrivéis. As cenas do esquilo Scratch continuam absurdas.
= Espetáculo Les Jardins D'Eden (Cia. Eolienne) - Técnicas circenses e coreografias que questionam a efemeridade da felicidade individual e coletiva de forma extremamente elegante e competente. A capacidade de diversificar os movimentos e as intenções e as aparentes diferenças temáticas entre um ato e outro são marcantes na obra.
= Espetáculo 9.81 (Eric LeComte) - Tecnologia e circo juntos numa performance de força e precisão técnicas. O conjunto visual é incrível!
= CD Pelo sabor do gesto (Zélia Duncan) - Sofisticação e cuidado no repertório continuam sendo a marca de Zélia. Descate para as versões em português de duas belas canções do belo filme Les Chansons d'Amour.
A atividade do cronista é narrar os fatos segundo um ponto de vista, sem se deter em nenhum, dando a eles certa "leveza" ao discutir núcleos problemáticos de uma sociedade. A "efemeridade" do suporte, seja o jornal impresso ou os espaços virtuais, faz com que a crítica também não atribua ao gênero a devida atenção.
Machado de Assis ironizou esta condição dizendo que "o folhetinista, na sociedade ocupa o lugar do colibri na esfera vegetal: solta, esvoaça; brinca; tremula; paira; espaneja-se sobre todos os caules suculentos, sobre todas as seivas vigorosas. Todo o mundo lhe pertence; até mesmo a política". Desprovida do rigor jornalístico das reportagens e do rigor literário dos romances, a crônica é, nas palavras de Machado, "uma fusão admirável entre o útil e o fútil".
Analisando a atuação dos dois escritores citados, enquanto Machado é um intérprete de um amanhã cada vez mais veloz e de uma cidade que começa a se partir, Clarice já está vivendo esta velocidade das informações e da fragmentação do Ser, numa sociedade que se torna cada vez mais "escrava" da imagem.
Evidente que para cada autor há uma modalidade de texto, o que dificulta precisar um gênero que acabou abarcando artigos, comentários, poemas em prosa, contos e relatos de viagem, entre outras coisas. Mas multiplicam-se os autores de crônicas e é preciso estar atentos para perceber quem faz da observação do ordinário o vislumbre de milagres. Ou seja, distinguir o deslocamento do real na ficção e vice-versa.
Texto publicado no Jornal A União em 10/07/2009
Entre outros, ouvi, vi e li, por estes dias:
= Filme A era do gelo 3 - O gelo fica na superfície, literalmente, e os personagens estão incrivéis. As cenas do esquilo Scratch continuam absurdas.
= Espetáculo Les Jardins D'Eden (Cia. Eolienne) - Técnicas circenses e coreografias que questionam a efemeridade da felicidade individual e coletiva de forma extremamente elegante e competente. A capacidade de diversificar os movimentos e as intenções e as aparentes diferenças temáticas entre um ato e outro são marcantes na obra.
= Espetáculo 9.81 (Eric LeComte) - Tecnologia e circo juntos numa performance de força e precisão técnicas. O conjunto visual é incrível!
= CD Pelo sabor do gesto (Zélia Duncan) - Sofisticação e cuidado no repertório continuam sendo a marca de Zélia. Descate para as versões em português de duas belas canções do belo filme Les Chansons d'Amour.
2 comentários:
Legal você falar sobre a produção cronística de Machado. Sobre suas crônicas, Júlio França, em sua dissertação de mestrado, chama a atenção para a importância dos anos de atividade jornalística de Machado como alicerce para seus últimos romances. Segundo Júlio, "os romances escritos por Machado após 1897 — especialmente Memorial de Aires (1908) — apresentam, contudo, uma estrutura narrativa com traços fortes da técnica da crônica desenvolvida pelo autor. Também a escrita memorialística de Bentinho e a estrutura fragmentada do diário do Conselheiro Aires guardam afinidades com a escrita cronística. No caso de Esaú e Jacó, John Gledson já apontou, em Machado de Assis: Ficção e História, como passagens do romance surgem de forma embrionária nas colunas da Gazeta de Notícias". Lembremos que também Clarice utilizou suas crônicas, ou parte delas, em seus romances.
Abs
Oi Leo,
Tudo bem?
Gosto muito de ler os seus textos.. embora não responda a todos! Fica muito claro pra mim tudo o que escreve e finalmente entendi o que é uma crônica :)
coisas de engenheiros..rs
um abração apertado.
Carol
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