
Confesso, talvez pela formação acadêmica que, se nos deixa sensíveis por um lado, torna-nos “insensíveis” por outro, fazia tempo que eu não experimentava uma sensação de inquietude tão profunda, no entanto consciente, diante de uma obra de arte.
Nos tempos em que se tenta discutir o que é o belo e/ou porque temos medo do belo, o ator, José Mauro Brant (foto) e seu diretor, Antonio Gilberto, conseguiram a medida certa do belo, sem medos ou arremedos, no soturno da obra de um artista grande e complexo como Lorca.
Com um bom currículo (está em cartaz também com o musical Aracy Cortez: A rainha da praça Tiradentes, que também já vimos, Carlos e eu), o ator conseguiu fluir num texto de pouco mais de uma hora – tratando de poesia, teatro, vida, folclore e costumes granadinos... –, sem perder as singularidades e sutilezas do personagem, os movimentos sutis, referenciando a introspecção e a melancolia de alguém sempre cutucado pela morte e a entonação vocal (ele canta e conta piano durante o espetáculo).
O roteiro tem uma visão, digamos, bem brasileira dos textos de Lorca, sem o "peso dramático" que teria caso fosse escrito por um espanhol, oferecendo leveza às densidades dramático-introspectivas do texto composto por inversões sintáticas interessantes, cobrando do ator maior trabalho de marcação, seja na luz algo transcendental de Paulo Cesar Medeiros, seja na cenografia de Ronald Teixeira.

Claro que foi visível algum nervosismo, vez por outra. Afinal era a estréia!
Todavia foi, sem dúvida alguma, algo extremamente tocante, seja pelo poder de causar a fruição do espectador, seja por realmente ter qualidade artística para calar qualquer crítica mais fria.
Por fim ficou ressoando em mim, dentre tantos questionamentos, estas palavras do Lorca, vivenciadas brilhantemente pelo ator José Mauro Brant: "O Teatro é a poesia que se levanta do livro e que se faz humana..."